terça-feira, maio 30

A difícil tarefa de construir um país

Tenho acompanhado os comentários de brasileiros, timorenses e de outros interessados sobre a crise desse país que tem apenas quatro anos de idade. Ela revela um pouco da difícil tarefa de muitas regiões do mundo, que viveram sob uma colonização exploradora, quando não genocída, de se organizar como Estado. Lembro das aulas de História, da diferença entre "nação" e "país".

O Timor precisou de ajuda internacional para criar suas leis, organizar suas instituições, língua oficial, estrutura. Muitos brasileiros estão lá para ajudar, mas essa tarefa tem sido muito difícil por diversas razões, inclusive interesses externos.

O que torna um conjunto de pessoas uma nação? O que dá forças para que juntas elejam líderes, criem e respeitem as suas leis e acabem por torcerem unidas, um dia, pela bandeira de seu país?
Países da Europa lutaram séculos entre sí para se tornarem monarquias e depois democracias e ainda assim não estão bem resolvidos (observe-se o ETA e o IRA). Na Ámérica, África e Ásia, as ex-colônias tentam se desenvolver como países, algumas com mais sucesso. No entanto, olhando mais de perto, há ainda diversos países passando por conflitos internos. Até mesmo os desenvolvidos. A França andou ardendo esses dias. Os EUA, símbolo de uma nação livre, esconde o fervor da insatisfação das etnias desfavorecidas. Bom, o Oriente Médio, dispensa comentários.

Um pequena parcela do mundo luta pelo ideal da casa-com-tv-e-carro-zero-na-garagem. O resto luta pelo direito de continuar vivendo e de viver em comunidade.

A princípio, o Brasil alcançou o ideal de ser uma nação. As lojinhas de 1,99 vão faturar milhões com coisinhas verde-amarelas pelos próximos dias. Vamos produzir bastante lixo e gritar bem alto. Vai ser um chatice para uma pessoa "cricri" como eu, mas é bom que seja assim. Queria que esse patriotismo e essa energia durassem mais.

O legal é que a gente pode passar um pouquinho disso para outros países, que nos adoram. É muito gostoso visitar outros lugares e ver o pessoal sorrir e bradar, com forte sotaque: "Brasil!"

Professores da CAPES que estão no Timor estão sendo evacuados para a Austrália, até que a situação se acalme no Timor, mas vejo pela lista, que eles não querem ir. Não se trata de perder tempo cuidando da educação dos outros, mas cuindando do mundo em que vivemos e aprendendo muito com isso, trazendo coisas boas para o Brasil. Os professores escreveram uma carta para o Ministro da Educação, pedindo para não abandonarem o trabalho. Transcrevo o depoimento de um deles:

"Estamos indo embora e sinto vergonha. Quem dentre nós tiver o mínimo de respeito pelo ser humano quando estivermos nos dirigindo ao aeroporto, baixe a cabeça e não olhe para as centenas de refugiados que estarão pelo caminho.
Estamos indo embora e o meu sentimento é, também, de derrota. Nem todas as dificuldades que superamos em um ano de Timor me farão sentir que, de alguma forma, deixaremos o nome do nosso país registrado na história da mais nova nação do mundo. Saltamos do trem pela porta do último vagão. Saímos justamente quando eles mais precisavam.
Deixamos para trás um povo que nos recebeu de braços abertos e que nos chama de irmãos. Deixamos pra trás um povo que lutou, luta e lutará para se libertar de toda e qualquer amarra. Nunca compreenderemos este povo por completo. Nunca saberemos tudo que passa pela cabeça de um timorense por mais que tentamos nos esforçar e, talvez por isso, os deixamos sem lhes dizer absolutamente nada.
Em Timor-Leste nos angustiamos, nos indignamos, nos ofendemos, nos perdoados, mas, sobretudo, aprendemos. Poderíamos ter qualquer outro argumento para deixar pra trás as expectativas que eles construíram sobre nós e nosso trabalho, mas não o temos. Passamos por momentos tensos e os superamos sem pavor. Mas agora somos obrigados a evacuar do país. Iremos para Darwin e ficaremos lá por 15 dias para depois o governo brasileiro decidir se voltamos ou não para o Timor. Mas temos a sensação de que tão cedo não voltaremos a ver essa terra. MEU SENTIMENTO É DE VERGONHA E DERROTA! "



Crianças do Timor Leste. Fonte.

Trecho da carta dos professores brasileiros ao Ministro da Educação:

“Entendemos que a Educação é peça fundamental no processo de retomada da paz e a participação ininterrupta da Missão Brasileira é de grande importância para assegurar a confiança nas atividades estatais e o apoio da CPLP ao Timor-Leste.
Recebemos continuamente pedidos de nossas contrapartes timorenses para que nossas atividades não sejam interrompidas e seus resultados comprometidos.
(...)
Portanto, sendo a nossa vontade concluir os projetos iniciados, e não abandonar o povo timorense nesse instante difícil, solicitamos que em caso de risco se preserve a integridade física dos professores brasileiros em lugar seguro até que a situação se defina e de margem para negociações."

Desejo do dia: uma alimentação saudável.

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