terça-feira, setembro 21

Sobre a China, Parte I (de “N”)



Conheço algumas pessoas que vivem aqui, mas não gostam dos chineses, nem tentam compreender o seu jeito de ser. Na China é comum as pessoas arrotarem, peidarem, cuspirem em público. Também costumam fazer muito barulho ao comer, o que para a nossa cultura é estranho. Mas nós, no Brasil, temos comportamentos que eles também não entendem, como ir à praia "sem roupa" e sair por aí beijando todo mundo no rosto.

Não sei se fui influenciada por escritoras sensacionalistas, mas assim que cheguei tive a oportunidade de ler dois livros interessantes sobre a China, escritos por mulheres chinesas: “Cisnes Selvagens” (Jung Chang) e “As boas Mulheres da China” (Xinran). Ambos retratam um pouco da realidade desse país na época atual e no século passado.

No Brasil, sofremos com a colonização, a escravidão, conflitos internos e a Ditadura Militar. Mas me senti tocada pelo sofrimento que os chineses passaram no último século, tendo sido dominados pelo Japão, exército Kuomintang, Rússia e Comunistas, cada um deles, por sua vez, cometendo abusos, torturas, assassinatos, vingando-se dos que apoiaram o exército anterior, ainda que o tivessem feito para sobreviver. A partir do desejo de vingança, de auto-defesa, de poder e outros que não entendo, os chineses ajudaram a massacrar os próprios chineses.

A família da escritora de “Cisnes Selvagens”, Jung Chang, viu passar pela sua cidade e entrar em sua casa cada um desses exércitos e sofreu atrocidades impensáveis para a classe média brasileira do século passado. E foi isso o que aconteceu com grande parte das famílias chinesas.

Essas pessoas sofreram terrorismo psicológico, miséria profunda, tortura e por fim, alienação, fome, destruição de todas as obras de arte (grande parte veio parar em Hong Kong), todos os livros que fossem anteriores a Mao Tsé-Tung, proibição de música e de outras manifestações culturais, assassinato, tortura e humilhação pública de professores, de estrangeiros e das pessoas que tiveram, alguma vez, comerciantes e empresários na família. Chegou-se a proibir o uso de expressões consideradas “hipocrisia burguesa” como "obrigado", "por favor" e "com licença".

A própria autora aprendeu a amar e a idolatrar o Camarada Mao. Quando criança, se não queria comer, diziam: “Pense nas pobres crianças do mundo capitalista que não têm o que comer”. Ela pode observar como eram construídos falsos relatos de professores e intelectuais sobre o sucesso da revolução chinesa, sobre sua reeducação na vida camponesa.

Eu posso não saber muito, mas alguns rebeldes brasileiros que agitavam (e ainda agitam) livrinhos vermelhos do Comandante Mao talvez soubessem menos ainda. Penso que quem acreditava na propaganda comunista de Mao estava tão alienado quanto os que acreditam nos filmes americanos. Quando conversava sobre a história do livro com alguém com tendências esquerdistas, esta pessoa me falou: “Você acredita em tudo o que lê”. E os que acreditam no que não leram, não viram, só ouviram falar? Não tenho nada contra a Esquerda ou a Direita, mas penso que há "alienação" nos extremos de ambos os lados.

Certamente a China está se desenvolvendo e já é uma das maiores economias do mundo. Mas quantas histórias há de mulheres cujas crianças são arrancadas do ventre ou mortas ao nascer, porque a lei só permite uma criança por família? Pessoas que não possuem irmãos, nem primos, nem tios?

As pessoas deixam o campo para trabalhar e morar nas fábricas, com o objetivo de, depois de anos, voltar para o campo com o dinheiro obtido. Ganham muito mais do que se lá permancessem. Os operários batem continência ao entrar nas fábricas. Na linha de produção, as mulheres trabalham enfilieradas, lado a lado e não é permitido conversar.

A Internet, filmes, TV, games e mensagens de celular são censurados (meus amigos na China não conseguem acessar esse Blog). Não se permite entrar no país com jornais e revistas estrangeiros.

As pessoas que trabalham com as fábricas chinesas admiram a obediência e disciplina dos chineses, mas reclamam da falta de criatividade, de jogo de cintura, de independência para a resolução problemas. O que é compreensível numa sociedade na qual “o que não é permitido, é proibido” e ser pró-ativo pode ser visto como insubordinação.

O livro “As Boas mulheres da China” mostra um pouco da China atual. Algumas mulheres têm acesso ao ensino universitário, aprendem inglês e se tornam independentes e poderosas, outras ainda são vendidas como escravas.

Mas é claro que eu não posso saber o que realmente se passa, apenas generalizar. Não posso dizer que ser chinês é ruim, pois acredito que para eles não deva ser. Não quero falar mal sobre uma cultura que não conheço bem e de coisas que não vivi. Também tivemos e temos nossos problemas no Brasil, nossa tortura, nossa alienação, nossos sofrimentos, nossa má educação, em todos os sentidos. E há também quem não goste de nós e do nosso jeito de
trabalhar. Assim é o mundo.

Desejo do dia: terminar de organizar a viagem para a Tailândia. Aliás, coisa de pobre, porque rido só precisa comprar o pacote e fazer as malas...

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