quinta-feira, novembro 27

Normalmente chove, às vezes piora

Vista da minha varanda em dia de chuva: ocupação nos morros e em torno do mangue do Itacorubi. Também não sei se o meu prédio deveria estar aqui, mas está regular e tem "habite-se".

Olá,

Uma notícia boa e muitas más. A boa é que eu defendi a minha dissertação. Foi tudo muito bem.
As más vêm de todas as tragédias que se revelam diariamente em nosso querido Estado. Elas foram deflagradas pela chuva, mas as causas vão muito além das chuvas.
O título da minha dissertação é “Dinâmica de sistemas aplicada ao planejamento de projetos de desenvolvimento: projetos de habitação social.” Eu usei simulação para analisar o problema do avanço das ocupações irregulares em Florianópolis, para apoiar a elaboração de projetos. Ainda estou num papo meio acadêmico eu sei.
Por coincidência, defendi a dissertação na sexta-feira à noite, quando começou a cair o “toró” que devastou muitas cidades, inclusive a minha.
As causas dessas tragédias são muitas e fazem parte do sistema político-administrativo e cultural que criamos. O livro "Planeta Favela", de Mike Davis, aborda bem a questão. Se parte da população não tem uma renda que permite viver em uma casa regular em um local adequado, se não há alternativas acessíveis para essas pessoas, o que elas podem fazer? O campo foi abandonado durante muitos anos e as famílias migraram em busca de oportunidades. Ao mesmo tempo, deu-se a falta de investimentos públicos em habitação, infra-estrutura e em planejamento urbano. O mercado informal tornou-se tão forte que a irregularidade não é mais a excessão. Não são apenas as pessoas muito pobres que constroem em áreas irregulares ou de forma irregular.
As inundações poderiam ser evitadas e as maiores tragédias ocorreram em função das construções e desmatamento em áreas que cederam. (Explicação aqui).
Segundo a ONU, em 2007 ocorreu um marco, passamos a ter mais moradores no meio urbano do que no meio rural. É preciso reinventar as nossas cidades para lidar com as questões que essa configuração implica.
No entanto, as decisões que realmente resolvem os problemas são dolorosas e difícieis. Principalmente para os políticos, mas também para todos nós, acostumados com as irregularidades que muitas vezes nos beneficiam. Cada esforço que deixamos de fazer agora vai ser cobrado no futuro. Com vidas.
Todos estamos sofrendo os efeitos das enchentes, deslizamentos, mas vou comentar sobre isso depois. Agora é hora de ajudar.
É preciso estar ciente de que o que estamos fazendo é atuar sobre os sintomas de um problema crônico muito grave, que precisa de muito mais para ser resolvido.
Ainda valem as palavras de Barbara Ward, (Conferência Mundial Sobre o Meio Ambiente, Habitat, 1976):
“ Nossa primeira impressão deve ser por certo o grau em que a sociedade industrial parece ter sido não tanto planejada para fins humanos como simplismente batida até ganhar um formato qualquer por repetidas pancadas de gigantescos martelos _ o martelo da tecnologia e da energia aplicada, o impulso esmagador do interesse nacional, o objetivo simples do ganho econômico.”
Foi o ano em que nasci.

Desejo do dia: que a esperança possa chegar a quem perdeu tudo ou quase tudo.
Obs: na minha página de agradecimentos da dissertação também lembrei de vocês: "Aos amigos do Blogue, que nunca deixaram de passar para me apoiar".

terça-feira, setembro 16

Filosofia

Estou prestes a marcar a defesa da dissertação.

Vai nascer na primavera.

Com novos sonhos...

Me vem a lembrança de Fernando Pessoa, como Alberto Caieiro

"Não basta abrir a janela

Para ver os campos e o rio.

Não é bastante não ser cego

Para ver as árvores e as flores.

É preciso também não ter filosofia nenhuma.

Com filosofia não há árvores: há idéias apenas.

Há só cada um de nós, como uma cave.

Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;

E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse,

Que nunca é o que se vê quando se abre a janela."

Desejo do dia: Um beijo para quem não me esqueceu. Eu não esqueci de vocês.

terça-feira, março 18

Personalidade

Somente quem é de SC vai entender o motivo de todos cantarem com tanto entusiasmo, neste clip da música "Certos Amigos", do Grupo Expresso. É o fundo para este post.

"Se certos amigos nos mostram que o mundo ainda é bom...
Por saber, que tendo você do meu lado eu me sinto mais forte
Quero beijar o teu rosto e pegar tua mão
Se cada estrela no céu é um amigo na Terra
A força do acaso do encontro é uma constelação"

Há tantos assuntos interessantes nesse mundo sobre os quais eu não sei muito...

Será que algum deles me ajudaria a saber mais sobre mim? Entender sobre personalidades, ego, a razão de eu ser como sou. Entender sobre filosofia e suas correntes. Entender sobre religiões e seus dogmas. Saber mais sobre literatura e sobre todos aqueles que criaram personagens para divagar sobre a alma humana.

Mas, para além desses temas, ninguém revela mais sobre mim do que meus amigos. Incluindo entre eles a minha família. Eles têm espelhos nos olhos. (Nem sempre eu gosto do que eu vejo.)

Esse é o meu critério para gostar de alguém logo de cara: olhos límpidos.

Com a máscara do trabalho eu me saio bem, afinal, é preciso dedicação e eu compreendo as regras. No entanto, na vida social eu sei que sou meio Brigit Jones, falo sem pensar, falo o que penso, dou muitos furos, sou tímida, distraída e até egoísta. O Bruno costuma dizer que, em alguns casos, eu não faço "questão de agradar". Mas qual a pílula que se toma para isso? A do tempo e da experiência? No fundo, creio que os maiores ensinamentos que recebo vêm dos olhos dos meus amigos e algumas vezes, das suas palavras. E acaba sendo o amor, essa força incrível, que está em tudo o que é vivo, que me faz desejar ser melhor do que eu sou.

(E por falar nesse amor, lembrei de uma notícia, que li esta semana, sobre um golfinho que ajudou as pessoas de uma praia a desencalhar duas baleias. E eles são de espécies diferentes!)

A gente, bicho curioso, procura explicações até no nome:
"LILIANA - De origem italiana, deriva da palavra latina lilium, a flor-de-lírio. Portanto, é um anthostônimo ( nome de flor). Este nome foi largamente utilizado por todos os povos, assim sendo, surgiram muitas derivações no espanhol:Lilian ; no francês Liliane; inglês: Lilian ou Lily. Liliana - Do inglês Lilian, que significa pura, inocente. Variantes: Liliane, Liliam, Liliosa. É dotada de um temperamento impulsivo, que não cede diante de nenhum tipo de pressão. Luta para alcançar suas metas. Sempre investe com sabedoria e precaução."

E procurando mais sobre o tema, encontrei essa linda declaração de amor a uma Liliane, que diz que o significado do lírio é "te desafio a me amar".

Desejo do dia: um bom descanço para um querido professor que faleceu esta noite. Ele tinha olhos límpidos e me ensinou lições importantes. Difícil acreditar que ele se foi.

quinta-feira, março 6

Fernando de Noronha, finalmente!

(Sim, uma pausa na suada dissertação.)




















A Ilha nos recebe com um arco-íris nos Dois Irmãos. Um sorriso?
É notório que Fernando de Noronha é um lugar belíssimo, sendo destino dos sonhos de muitas pessoas que eu conheço, em parte por causa das inúmeras reportagens que mostram o local como um paraíso na Terra. E é lindo mesmo. No entanto, o que mais me encantou não foi a paisagem, mas a vida, o contato com uma natureza que não se sente ameaçada pelo homem. Grandes Resorts, espreguiçadeiras na praia, chalés a poucos metros da areia, isso não existe por lá. Mesmo os hotéis mais arrumadinhos não ficam na beira da praia. As praias mais belas (para nós, a Baía dos Porcos, a Praia do Sancho e a Praia do Leão) ficam distantes das vilas e ainda que se vá de buggie, é preciso caminhar um tanto. Há pouquíssima gente durante o dia. Chegamos a ficar sozinhos várias vezes, mesmo em alta temporada. E são cheias de vida.
Em nosso primeiro dia, decidimos fazer uma caminhada pelas praias do mar de dentro, partindo da Vila dos Remédios. No caminho, ficamos admirados com os mergulhos dos enormes atobás nas ondas. Eles não mostravam nenhum receio e mergulhavam e nadavam ao lado das poucas pessoas que encontramos.












Foto: Bruno, no começo da nossa caminhada.
Depois de cerca de uma hora caminhando, passamos pela praia da Cacimba do Padre, onde estava acontecendo um campeonato de surf e portanto a praia estava “lotada”, com umas cento e cinquenta pessoas.
Mas eu queria chegar logo na próxima praia, a Baía dos Porcos, que eu já adorava por fotos, uma pequena baía de cerca de 50 metros, famosa por aparecer nas principais imagens dos montes Dois Irmãos, símbolos da Ilha. Eu queria mergulhar ali porque era lindo. Ao preparar o snorkel, de fora da água, vimos uma tartaruga boiando para respirar. Corremos, achando que ela iria a algum lugar. Que nada, ficou ali, do nosso lado, a cerca de dois metros da areia, bicando as algas da pedra. Ali estava também outra tartaruga, maiorzinha. E logo vimos mais duas arraias e muitos outros peixes interessantes, como o estranho peixe cofre. Nas árvores à beira da praia, muitos ninhos de aves marinhas, como as viuvinhas e noivinhas.






Foto: Baía dos Porcos.
Quando a maré subiu, caminhamos até a próxima praia, do Sancho, também lindíssima, cujo acesso se dá por uma escada de ferro, como as de incêndio, em uma fenda na rocha e depois, alguns metros de escadaria irregular. Subimos e caminhamos por uma trilha de 150 metros até a bela vista da Baía dos Golfinhos. A Ilha tem uma vegetação seca (fazia tempo que não chovia descentemente) e uma fauna bem restrita, formada por pássaros como uma espécie de pomba com pezinhos vermelhos, que caminha entre as árvores, lagartos e uns mini-lagartinhos chamados mambuias e preazinhos chamados mocó. Não há cobras por lá.

Foto: Praia do Sancho.
Depois deste dia, descobrímos que onde quer que mergulhássemos, de cilindro ou não, haveria muita vida. Encontramos muitas tartarugas, arraias, tubarões, polvo, lagostas, linguados, enguias e centenas de espécies de peixes. Na praia do Sueste é possível nadar em meio a pelo menos uma dúzia de tartarugas de vários tamanhos. Todas as praias são povoadas por lindos linguados coloridos. Acho que nunca mais vou conseguir comer um polvo ou um linguado. No entanto, na praia do Leão, fizemos um divertido mergulho de snorkel em meio a um gigantesco cardume de sardinhas, e eu me senti mais solidária aos atobás que também mergulhavam conosco, pescando as sardinhas. Alguns peixes me parecem mesmo com comida.
E os golfinhos? De vez em quando eu olhava para o mar, e lá, ao longe, estava um grupo passando, saltando. Chegamos bem perto deles em um passeio de barco, mas ainda não realizei o sonho de encontrá-los embaixo da água.
As estrelas da viagem, para mim, foram as tartarugas, por ter tido tantas chances de estar bem próxima delas. Ainda tivemos o privilégio de fazer um “passeio” que consistia em passar a noite na Praia do Leão com um biólogo do Projeto Tamar, com o objetivo assistir à desova das tartarugas verdes gigantes. INCRÍVEL!
Chegamos na praia às nove horas de uma noite de lua cheia e já pudemos ver os rastros de duas tartarugas que haviam subido para desovar. Não dá para descrever aqui o sentimento de presenciar todo o processo desse ser imenso (as duas tinham 1,05m e 1,10m) e dócil. Acompanhar a sua aventura ao sair do mar, subir muitos metros até as dunas, arrastando seus cerca de 250 quilos (que na água flutuam), cavar por horas, com suas nadadeiras macias, em uma respiração profunda, olhando para nós, com os olhos mais doces e, depois de horas de esforço, arrastar-se de volta para a água, onde vai atravessar o mundo, nesse oceano infinito. Após a desova, pudemos deitar ao seu lado e tocá-la com cuidado.


Passamos a noite em uma cabana (a única da Ilha que fica na praia) e pela manhã, além da linda vista da praia, fomos presenteados com a visão de um ninho que havia aberto durante a noite e testemunhamos as novas tartaruguinhas partindo para sua jornada pelo mar. Apenas uma em mil sobrevivem até a idade adulta e, não importa o quanto viagem pelo mundo, depois de muitos anos e quilos, elas voltarão para desovar na praia em que nasceram.
Fizemos muitas caminhadas, mergulhos, conhecemos muita pessoas legais, mas sobretudo, estivemos mais perto dos outros seres da natureza do que nunca, e pudemos olhar em seus olhos, nadar lado a lado e entender que o paraíso não é paraíso porque é lindo e sim porque é cheio de vida...
em paz.

Desejo do dia: raciocínio.