terça-feira, novembro 30

Millôr

Pegamos o telefone que o menino fez com duas caixinhas de papelão e pedimos uma ligação para a infância. (Millôr)

Dia desses descobri que o Millor Fernandes tem um
site, ou melhor, um saite, como ele prefere. Lembrei que gostava dele quando criança, que lia e relia suas Fábulas Fabulosas e resolvi escrever-lhe. Fiz isso porque uma vez eu quase mandei um e-mail parabenizando o Sérgio Vieira de Mello, admirada com o seu feito na ONU. Mas não escrevi e logo depois ele morreu. Me arrependi. Carinho e admiração a gente não deveria guardar quando sabe que é algo que todos desejam (ou quase todos?).

Enfim, o velhinho (no bom sentido, pois ele tem 80 anos e olhar de 20) não é politicamente correto, principalmente com as mulheres e costuma ser infame, mas eu passei a infância gostando dele e sendo condizente com suas peraltices. Sendo assim, escrevi-lhe:

“Só para dizer que, quando eu era criança, adorava ir para a biblioteca do colégio ler seus livros, as Fabulas Fabulosas. Li muitas vezes. Agora, fico feliz de poder acompanhar o site. Você me ensinou muito sobre imaginação.Obrigada!”

Em duas semanas, recebi esta resposta: “Vá em frente, Liliane. Voe sem avião. Esse é o bom de voar. Abração, Millôr”

Fico feliz não porque ele respondeu, mas porque recebeu.


Além de ter um saite que é quase um blog, ele também já participou de um bate-papo na Internet. Copiei um trecho ilustrativo:

Anderson fala para Millôr Fernandes: Porque vc nao se candidata para a academia brasileira de letras como o Carlos Heitor Cony?
Millôr Fernandes: Anderson, eu sou há muito tempo candidato à Academia. Mas só aceito ir para a cadeira 38. A de Sarney.”

É o avô dos blogueiros!

Mais:

- Entrevista.
"Eu também não quero ser reconhecido apenas pelo meu talento. Eu quero posar nu!".
- Biografia.
- Poesia.
- Barata.
- Reflexões sem dor.
- Camponês.
- Mulher.
- Banheiro.
- Vovozinha.


Desejo do dia: O quê: Pequenas bolhas cheias de líquido claro ou amarelado que formam crostas quando se rompem. Como: Provocada pelo vírus da catapora, o herpes vírus, que fica incubado em um músculo do corpo e se manifesta quando há uma queda na resistência imunológica da pessoa. O porquê: sol de domingo. A radiação dos raios ultra-violeta (UVA e UVB) agem bloqueando a ação das células de defesa do organismo e reduzindo a proteção imunológica. Onde: lábio superior, canto direito. Então: dói. Desejo: saúde.

quarta-feira, novembro 24

A festa dos desejos

A decoração de Natal de Hong Kong já está começando a fervilhar. Logo logo vamos estar esbarrando em árvores, bolas, trenós e todos os ícones dessa data de união e consumo. E por falar em união, vamos também tropeçar em todas as famílias que se juntam para tirar fotos na frente desses enfeites. Uma mania. (Só para lembrar, 9O% da população de Hong Kong é budista e taoísta.)

É de ofuscar os olhos o que eles fazem por aqui. Os prédios imensos ganham uma decoração de neon colorido, de gosto duvidoso mas eficiente no quesito festerê. Exemplo aqui.

Para muitos, o Natal é uma data controversa e por isso eu não vou entrar em nenhuma questão sobre consumismo X magia, alegria X tristeza, saudades X união, Papai Noel da Coca-Cola X Menino Jesus, paz na Terra X “farinha-pouca-meu-pirão(ou peru?)-primeiro” etc. Eu só quero colocar para reflexão uma campanha que recebi. Por estar relacionada ao Natal, sei que ela enseja alguns dos empasses citados, mas enfim... Só sei que essa é uma data em que a pobreza costuma doer ainda mais.

“Gostaria de divulgar que os Correios abrem as cartinhas que as crianças mandam para o Papai Noel e tentam atender aos pedidos.
Inicialmente, é feita uma triagem das cartas para atender as comunidades mais pobres, creches, orfanatos etc.
Quem quiser e puder ajudar, pode ir no correio e ler as cartinhas, escolhendo aquela com que mais se identificar.Mas já aviso: haja coração! o que tem de criança pedindo comida,emprego para a mãe, caderno para estudar etc, é duro... uma das crianças apadrinhadas pediu um colchão para dormir... é triste, né?
É claro que tem muito pedido de bicicleta, barbie, poli, video-game. - Esses sonhos de qualquer criança - enfim - tem pedido para todogosto e bolso!
Depois que comprar o presente, basta entregar no próprio Correio,que eles se encarregam da entrega. (...)
Se alguém preferir, não precisa apadrinhar uma carta específica. Pode doar o que quiser, que o pessoal do correio seleciona para quem mandar.” (Não sei quem escreveu pois veio passando adiante)


Mais sobre a campanha no site dos Correios.

Desejo do dia: descansar.


terça-feira, novembro 23

Quase esqueci de mim


Eu tive muitos cães durante a minha infância, pois costumava levar os que encontrava na rua para a minha casa. Meu pai, gostando de animais e sabendo o quanto poderiam nos ensinar sobre relacionamentos, às vezes me deixava ficar com eles. Se davam um pouco de trabalho, também poderiam auxiliá-lo na ilimitada tarefa de nos ensinar a crescer.

Dentre tantos, eu tive um grande amigo vira-latas que me acompanhou durante toda a adolescência, de nome Paxá. Lembro de ter para com ele um amor consciente, a ponto de entender que ele não ficaria comigo para sempre, já que cães não vivem tanto quanto a maioria de nós, super-humanos.

Quando me lembrava disso, chegava bem pertinho daquele olhar imenso e lhe dizia com os meus olhos - dado que essa era a nossa melhor comunicação – algo terrivelmente piegas, mas eficiente:

- Sei que um dia você não vai estar mais aqui, então eu vou lhe dar um abração agora, porque quero lembrar para sempre dessa sensação gostosa. Lembrar que fomos muito amigos, que você existiu para mim e que eu amei você tudo o que eu podia, que fiz tudo o que eu podia.

Mais tarde, eu comecei a ter essa atitude também as pessoas que amo, entendendo que a vida é efêmera.

Mas foi somente bem mais velha que eu aprendi a me olhar no espelho e a fazer isso comigo mesma. Afinal, também quero ter sempre a certeza de que eu me amei tudo o que eu podia.

Há pouco tempo, recordando o meu bairro, lembrei da minha adolescência, dos meus antigos pensamentos e cheguei a me espantar com o quanto eu já havia esquecido sobre uma pessoa inteirinha que eu fui. Desconfio que eu não amava aquela menina descabelada que eu era, mas ela/eu, do seu jeito, tentava amar a todo mundo. Procurei-a na minha nova imagem no espelho e recordei frações do meu dia-a-dia. De uma adolescente chata, mas interessante, cheia de manias e teorias engraçadas, que se subestimava muito.

É difícil recordar de tudo o que ela/eu gostava e sentia, pois muitos detalhes se perderam ou estão trancafiados em algum esconderijo. Bem guardados para, quem sabe, evitar essas bisbilhotices futuras. Talvez um dia eu os encontre em alguma empreitada arqueológica da velhice – e ainda irão dizer que estou senil.

Estava pensando em fazer uma festa para essa menina, comprar-lhe um presente e até levá-la para um passeio, no qual eu poderia contar-lhe um pouco sobre mim, tentando relembrar suas alegrias e alguns desejos irrealizados.

Eis que o tempo não é uma ilusão? Os acontecimentos não estão dando voltas em torno de nós? Então por que eu não posso visitar aqueles dias? Ou ela me visitar? Por que não posso ter um encontro comigo mesma, mais nova, perguntar como eu estou e conversar? Quem disse que eu não posso? Nada que vive dentro de mim é passado e nem ninguém.

Eu já sei onde ela está, nos diários que eu guardei, mas que ficaram no Brasil... Quando eu voltar, teremos esse encontro. Vou contar sobre o mundo e as coisas que conheci e perguntarei a ela sobre seus sonhos, os que ela nunca contou para ninguém, todos aqueles que eu já esqueci.

Desejo do dia: aproveitar Hong Kong.

domingo, novembro 21

Usando folhinhas da Árvore dos Desejos


Desejo: um dia vou ter um desses... ou um vira-latas parecido. (Fonte)
O nome dele será Indiana Jones (Indiana Jones sim, e daí?).

Desde que fui morar sozinha, aos 18 anos, nunca mais tive um cachorro porque nunca mais morei numa casa ou, pelo menos, num apartamento grande o suficiente para isso. Assim, ele faz parte dos meus desejos: um dia terei filhos; um dia escreverei livros; um dia trabalharei para a ONU; um dia verei a aurora boreau; um dia aprenderei a usar a vírgula; um dia terei o Indiana Jones...

Pois é, enquanto isso, continuo a parar com cara de palhaça na frente das petshops, gerando sentimentos de pena e risos nos transeuntes.

Aliás, há muito que tenho uma dúvida: o que essas lojas fazem com os filhotes que ninguém compra?

Desejo do dia: uma alimentação saudável. Ou seja, força de vontade.

quinta-feira, novembro 18

É um trabalho sujo, mas alguém...

"Todo progresso está baseado no desejo inato e universal de todo organismo vivo de viver acima de suas posses." Samuel Butler

Quando eu era mais nova, era o terror das empregadas, faxineiras, governantas e afins, principalmente quando moravam lá em casa. Não só porque eu era egoísta, anti-social e pirralha, mas porque era um tipo de relação com a qual eu nunca soube lidar, para a aflição dos meus pais, que tentavam me transformar num ser humano educado e gentil.

Depois, comecei a me perguntar: para que possamos ter certos confortos algumas pessoas precisam ser pobres? Se todos tivessem as mesmas chances quem iria faxinar? Limpar as ruas? Construir prédios? Capinar? Às vezes eu ainda fico sem graça diante da nossa faxineira em Hong Kong, que vem limpar o meu chão, o meu banheiro.

Certa vez um professor de Economia Política me respondeu que as máquinas deverão fazer todo o serviço mais pesado no futuro. É verdade que a mecanização do trabalho é cada vez maior, mas ainda há muito que as máquinas não podem fazer e tão cedo não poderão.

O que significa que por muito tempo eu vou ter que passar por essas situações.

Com relação à hierarquia nas relações de trabalho, tudo bem, pois, a principio, todos têm as mesmas chances, mas eu teria sido uma péssima rainha.

(...)

O mundo tal qual ele funciona, está longe de um dia ser justo. Não há lugar para que todos tenham tudo o que dizem por aí que todos deveriam querer: casarão, fazenda, carro(s), iate, ilha particular e por aí vai. Por outro lado, comunistas, socialistas, anarquistas estão falidos. Só sobraram os capitalistas e os terroristas.

Depois de ter escrito isso, me deparei com a seguinte notícia: O Globo. "Charles acha que nem todos podem subir na vida. Príncipe causa furor ao criticar sistema educacional moderno, por dar esperança de ascenção aos súditos." Seriam palavras dele: "tudo é resultado do utopismo social que crê que é possível manipular genética e socialmente a humanidade e contradizer assim as lições da História". Será que ele quis dizer isso ou manipularam as suas palavras? Enfim, acho que compreendo a depressão da Diana.

The Mirror: "Know your place". The Independent. Outras opiniões (inglês).

Desejo do dia: estudar.

segunda-feira, novembro 15

Festas de Hong Kong: Festival Latinoamericano


No mês do Festival Latinoamericano, estão servindo churrasco brasileiro no Coyote, um bar mexicano, que sempre toca músicas latinas diversas (quase nunca brasileiras, porque em Hong Kong não tem uma única banda brasileira - ninguém nem para mandar "um banquinho e um violão").

Os cartazes sobre as mesas fazem a introdução ao cardápio típico: churrasco e caipirinha. A caipirinha até que foi aprovada, feita com a legítima 51, mas o churrasco... Deve ser como comer comida chinesa no Brasil.


Cartaz sobre a mesa, com explicações sobre o churrasco.



Detalhe, tradução livre:
“Churrasco (shoo-rahs-ko) tem sido uma tradição culinária por mais de três séculos no Rio Grande do Sul (Sul do Brasil) tornando-se também um prato nacional. Antigamente “gaúchos” (cowboys do Sul do Brasil) espetavam grandes pedaços de carne e colocavam para assar lentamente sobre as brasas, enquanto contavam suas aventuras pelas planícies.”

Já a Fiesta on the Beach, na praia de Pui O, foi ótima, começou de manhã e entrou pela noite, reunindo latinos, agregados e simpatizantes, com direito a muita salsa e merengue (e nenhum samba), frescobol, futebol, vôlei, biquines, malemolência e bandeira do Brasil, porque brasileiro nunca perde uma boa chance de aparecer.
Uh tererê!


Brasileiros e amigos X ingleses e amigos


Mesa brasileira

sexta-feira, novembro 12

Cotidiano

Eu tô com o dedão do pé coçando. O Bruno, que não acredita nem em duendes, disse é para eu não coçar porque isso significa dinheiro (?). Às vezes eu não sei quando ele está falando sério.

Devo estar prestes a receber uma bolada pois algum bicho me mordeu e coça muito, pertinho na unha. Não me lembro de ter visto formigas em Hong Kong. Para compensar, o outro pé, que foi pisado ontem por um salto agulha ensandecido, está doendo. O que significa um pé pisado por salto agulha?

Eu ia perguntar para o Bruno, mas ele está lá, concentrado, trabalhando. Ele é uma criatura disciplinada que, quando não está na China ou numa reunião por aqui, trabalha em casa, no micro. Ele põe uma musiquinha e fica lá absorto. Às vezes, como agora, eu fico na sala, entretida com o laptop e nós trocamos uns comentários a cada uma hora. E nem precisamos gritar, no nosso apartamento “imenso”.

Como ele coloca para tocar as 999 mil músicas do arquivo de forma aleatória, de tempos em tempos, surgem bizarrices como essa que estamos ouvindo agora: Trem Azul, do Roupa Nova. “Te dou meu coração, queria dar o mundo...” E ele ainda companha um trecho que acabou de aprender: “confessar, sem medo de errar...” e cantarola o resto. Às vezes faz isso porque sabe que eu vou rir, às vezes por viagem mesmo.


Depois de quase 10 anos, de vez em quando, penso que ele é na verdade uma parte de mim fazendo coisas que eu não poderia estar fazendo naquele momento ou coisas que eu faria se fosse homem ou coisas que eu faria se eu quisesse ser outra pessoa. Ou ele é simplesmente a pessoa que eu seria se tivesse que viver comigo (?).


América, “A horse with no name”, la,la,la,la,la,la….

Com o pé que dói eu coço o pé que coça e com o pé que coça eu faço carinho no pé que dói. Isso é amor. Se não fosse confortante e divertido, não seria amor.

Desejo do dia: risos.

Ah, o Bruno é engenheiro de qualidade de uma empresa brasileira de telefones.


quarta-feira, novembro 10

Rapidinha

Variações sobre o mesmo tema...

Entre aqui e ria :)
com alguns americanos que estão pedindo desculpas. (Descobri aqui)

Entre aqui e chore :(
por um brasileiro dando uma de americano fundamentalista wannabe.

Mais sobre o assunto.

Assim eu nem preciso falar nada.

O desejo do dia está no primeiro post de hoje e vale para amanhã também!

Ainda sobre comida

Pastel, aqui em Hong Kong? Como se diz lá na Ilha: “Mofas com a pomba na balaia!”

Até onde eu fiquei sabendo, aquele pastel do “chinês da esquina” ou da feira é uma invenção dos chineses que foram para o Brasil e surgiu a partir do bolinho primavera. Bom, lendas urbanas a parte, o fato é que não tem disso aqui não. A não ser no nosso “Buteco”, um bar de esquina de um nepalês chamado Biro, muito gente-fina, onde os meninos vão tomar cerveja gelada toda quarta-feira, depois do futebol (e sempre que surge uma chance).

Os meninos ensinaram o Biro a fazer um pastel de queijo no brazilian style, assim como a picanha, que ele compra de uma importadora do Brasil (pois aqui os cortes de carne são diferentes). Certa vez, rolou até filé mingnon com Catupery, aquele queijinho com freqüência contrabandeado na mala de brasileiros viciados (não vendem Catupery aqui, o que prejudicou 50% do meu cardápio. Batata-palha? Mofas!).

Assim, sempre que bate aquela vontadinha, a gente corre para comer o pastel do nepalês da esquina.

Por outro lado... Dia desses, durante um jantar, um fornecedor perguntou para o Bruno se ele gostava de “camarões frescos no vinho" e ele disse que sim, como sempre. Na verdade é uma oportunidade para os caras comerem o que eles adoram às custas da empresa. Por que o Bruno iria acabar com essa alegria?

Entre os pratos principais, veio um prato fundo transparente onde se via um líquido escuro, que ficou fechado. Depois de um tempo, curioso, o Bruno abriu a tampa e lá estavam, boiando no vinho, camarões vivinhos da Silva. O anfitrião disse que eles ainda não estavam prontos, que eles tinham que morrer primeiro, bêbados e felizes, no vinho. Quando os chineses começaram a comer os bichinhos, que já estavam quietos, o Bruno pegou um, mas ele pulou. Resolveu então perguntar como se matava o pobre e alguém na mesa respondeu: morde a cabeça!


O Bruno deu um jeito de cortar a cabeça da criatura com os palitinhos e comeu só unzinho.

Desejo do dia: pastel de queijo.



segunda-feira, novembro 8

Bicho-grilo


A Crossroads é uma ONG de Hong Kong cujo trabalho é recolher doações de todo o território e enviar para outras organizações do mundo que estejam precisando. Assim, é possível perceber quanta riqueza há num lugar tão pequeno como Hong Kong. Quando um hotel troca seus móveis, quando uma empresa troca computadores, tudo isso pode ser doado para a Crossroads. Além de roupas, livros, óculos, material escolar... Voluntários separam, empacotam e colocam o material em containers, que empresas transportam de graça para outros países.

Uma outra organização, ligada à Crossroads, a Global Hand, faz um trabalho complementar, coordenando doações de todo o mundo e fazendo-as chegar até as organizações que precisam, sem que seja preciso passar por Hong Kong.

Tudo isso numa estrutura muito simples e até humilde, na qual ninguém é contratado, todos são voluntários e as instalações são emprestadas pelo governo.

Além de ser ajudada por adultos voluntários, grupos escolares e outros diversos, a Crossroads também tem um programa no qual proporciona uma atividade, roupas e transporte para refugiados, até que encontrem algum trabalho. Agora, uma vez por semana, eu “viajo” durante uma hora para chegar até a Crossroads, ajudando naquilo que eu sei: assuntos administrativos.

Os produtos doados são normalmente de boa qualidade, bonitos e caros. Por mais que eu saiba que esse material vai ser importante na vida de algumas pessoas, ao observar os refugiados africanos trabalhando no empacotamento, tão pobres que parecem ter saído das fotos da Etiopia e demais países que decoram as paredes, fico pensando em como vai ser difícil diminuir as injustiças sociais deste mundo. Eu sei que não é só de doações que essas pessoas precisam, que isso não resolve o problema. Por outro lado, um computador pode mudar a vida de muitos de uma forma que nem é possível prever. Às vezes, ter uma cama para dormir já muda muito. Ter um brinquedo para brincar, muda muito. Se isso pode ser feito, por que não?

Em janeiro voltaremos para o Brasil, ainda nem sei no que vou trabalhar, se volto para o meu antigo trabalho. O que sei é que gostaria de fazer alguma coisa em relação a isso:

Para relator da ONU, fome no mundo é uma "vergonha".
27 de Outubro de 2004
"Como podemos continuar vivendo com essa vergonha?". A pergunta foi feita por Jean Zigler, relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para o Direito à Alimentação, em um relatório sobre o acesso à comida no mundo. De acordo com o documento produzido por Zigler, a cada minuto doze crianças com até cinco anos morrem no mundo em consequência de doenças relacionadas à falta de comida e o número de desnutridos não pára de crescer. Isso apesar de a produção de comida ser suficiente para alimentar toda a população mundial. (Fonte)


Dizem que os jovens são idealistas e querem mudar o mundo. Mas ninguém diz em que idade isso acaba.

Desejo do dia: estar no caminho certo ou então, fazer um.

sexta-feira, novembro 5

"Eu sou da América do Sul...

... eu sei vocês não vão saber." (Para Lennon e Macartney, Milton Nascimento)

Esta semana tem Latinoamerica Festival em Hong Kong, promovido por alguns consulados do nosso continente, inclusive o do Brasil. Vão ser muitas festas, salsa, samba, churrasco, futebol e mostras de arte e cinema.

Mesmo com tantas caricaturas, tenho orgulho da nossa cultura. Apesar de alguns brasileiros não demonstrarem muita identificão com os vizinhos, gosto de ser latinamericana. Gosto, ainda que os americanos, com sua mania de rótulos, tenham dado um tom pejorativo ao termo, chamando maliciosamente os seus imigrantes de latinos e “chicanos”.

A Ásia costuma se apresentar como um mosaico cultural, um lugar exótico a ser visitado. Embora cada país tenha suas características e faça sua própria propaganda, há muitas reportagens, documentários e material de marketing considerando a Ásia como um todo. Roteiros para viajantes incluem visita a vários países, que nem sempre são próximos. A América latina é tão bonita quanto, mas não faz a mesma propaganda. Também apresenta uma cultura milenar, com cidades e templos antigos, belas danças e artesanato, mas não vende tanto.

Há um pouquinho de ilusão a respeito da "exoticidade" da Ásia. Fora algumas diferenças culturais e arquitetônicas evidentes, muito do que se vê é artificial, existe para o turismo. Máscaras, artesanatos, apresentações, são produzidos em massa. Excursões são realizadas com centenas de turistas, como numa Disney cultural. É difícl alcançar o que é realmente original. Para isso, é preciso tentar roteiros alternativos e colher boas dicas. O resto é apenas o velho e belo terceiro mundo (com exceção do Japão, claro). É claro que a Ásia é interessante e bonita, que vale à pena ser visitada e que aqui se aprende muito. Mas a América Latina também é muito bonita!

É uma pena que tenhamos sido tão massacrados pelos nossos antepassados colonizadores – que fazem parte de nós, agora – a ponto de idiomas e culturas inteiras terem sido perdidos. As pessoas da Ásia ainda parecem asiáticas, mas nós, na América, nos misturamos e nos transformamos. Adquirimos muito da cultura européia e, nos últimos anos, também da norte-americana. Criamos uma nova cultura.


Na América Latina nasceram Garcia Marques, Borges, Neruda, Tom Jobim e muitos outros. Nasceu o tango, o samba, a salsa etc. Tantos talentos e manifestãoes artísticas, que torna-se difícil e injusto enumerá-los.

Diz-se que temos muitos problemas como o paternalismo, a indisciplina, a corrupção etc. Mas penso que é possível dizer que a América Latina tem uma bela identidade bruta, que (sem esquecer nossos antepassados, povos guerreiros) revela uma cultura pacífica, de muita imaginação, emoção e de ternura. Ainda é preciso entender, lapidar e fazer brilhar essa identidade.


É como se estivéssemos guardando algo especial para mostrar ao mundo.

Desejo do dia: assistir ao DVD "Tambores de Minas", de Milton Nascimento, especialmente "Nos Bailes da Vida". Um dos melhores shows que assisti na vida.

quarta-feira, novembro 3

Culinária chinesa... Quem quer pão?

Hum, vamos começar com o café da manhã.

Ao viajar pela Ásia, é preciso prestar atenção nas características dos hotéis e ver se eles servem café-da-manhã ocidental. Sim, porque os chineses e muitos outros asiáticos comem no café da manhã o mesmo que nas demais refeições: arroz, noodles, salada, carnes etc. Mesmo quando o hotel oferece a opção ocidental, dependendo de sua categoria, às vezes isso quer dizer que vai ter leite, café, sucrilhos e pão com geléia, só. Nem um mísero queijinho. Enquanto isso, bombando no buffet ao lado, todo tipo de pratos quentes.

Por mais apetitoso que pareça, um mecanismo interno me impede de atacar um fried rice com camarão às 8:00 h da manhã... O Bruno já é um ser humano bem mais flexível, mas também não encara, muito.

Hotéis melhores servem panquecas, omeletes, presunto cozido, salsichas, vários tipos de pães, sucos, iogurte. O mais raro mesmo é o queijo. Lembro com nostalgia dos cafés maravilhosos do interior de Santa Catarina e de muitas partes do Brasil... Ainda bem que eu moro em Hong Kong onde podemos comprar delícias do mundo todo e tomar um gostoso café no Starbucks, enquanto outros mandam ver no noodles.

De vez em quando, é chato lidar com tantas diferenças, mas sempre concluo:

Deus criou um mundo com diferenças culturais para a gente se divertir e não para ficar brigando!

Queria que mais gente entendesse isso.

Desejo do dia: passa gripe chata! Hoje fomos no médico, um oriental super-simpático. Um amor, eu diria. Medicina chinesa? Que nada, voltei para casa com um vidro de xarope e quatro pílulas diferentes. Espero melhorar.

segunda-feira, novembro 1

Culinária chinesa...


Mesa tradicional de restaurantes chineses, redonda e com centro giratório.

Pergunta do Bruno, no último post: "Estou escrevendo um conto que envolve uma região oriental e, por isso, gostaria de saber alguns pratos exóticos para nós e comuns aí onde vc está. Pode citar alguns?"

A culinária oriental, inclusive a chinesa, tem muitas delícias até bem "normais" e assim, eu acabo sempre pedindo aquilo que eu sei que é bom. Para falar sobre pratos mais “diferentes”, preciso do auxílio do meu marido (que também é Bruno), cujo lema de sobrevivência nos restaurantes chineses é “comer primeiro e perguntar depois”.

Ele é sempre convidado para almoçar ou jantar pelos fornecedores, faz parte da cultura chinesa. Inclusive, se você for vendedor e tiver que agradar, tá ferrado, pois eles te desafiam a virar copinhos de vinho chinês, batendo com eles na mesa e bradando: “kampai”. E você pode ser desafiado por cada um dos componentes da mesa (coisa linda!). Como o Bruno é cliente, passa batido nessa parte.

Rola um bolinho primavera? Um franguinho xadrez? Doce ilusão! O Bruninho me passou um roteiro básico de um jantar ou almoço tradicional (numa mesa redonda de centro giratório):
1º - São organizadas as louças: bowl (a cambuquinha principal), prato (para cuspir os restos), colher para sopa (aquela impossível de ser usada sem fazer barulho), palitinhos e o copinho para o chá, juntamente com a toalhinha para limpar as mãos.
2º - É servida a entrada. Exemplos: água viva apimentada, pé-de-galinha cozido e pálido, língua de pato, amendoím.
3º - O anfitrião de maior nível hierárquico (ou alguém designado por ele) pede os pratos principais.
4º - Durante a refeição, serve-se continuamente chá ou água quente.
5º - A sopa chega. O garçom serve o caldo para todos, separa a parte sólida e a coloca em um outro prato.
6º - Chegam quatro ou cinco tipos de carne e alguns pratos de legumes cozidos. Normalmente, eles servem vários tipos de carnes que para nós não combinariam entre si: porco, boi, aves, todo tipo de miúdos e frutos do mar (TODOS os existentes nos sete mares), enfim, animais diversos.
7º - Quando todos parecem satisfeitos, para finalizar, pergunta-se se alguém ainda precisa de arroz (puro), noodles ou pão com recheio de porco ou com leite condensado (segundo o Bruno, “para dar uma entupida”).
8º - Servem frutas (dificilmente uma sobremesa).
9o – Em meio ao jantar, ainda pode rolar o tal “kampai”!

Bom, esse é só o roteiro. Falta falar sobre variações do cardápio e sobre os diversos pratos do dia-a-dia, sobre o café da manhã e as sobremesas. Por exemplo, você já ouviu falar do “ovo de mil anos”? Ou do tofú fedorento? Pele de pato? Lula seca no palito? Aqui tem sim senhor!


Mas essas são cenas do próximo post, porque este já está gigante!

Li por aí que os chineses têm um ditado: "Chule feiji zhi wai, yangyang duo chi". Ou seja: "Na China comemos tudo exceto aviões e trens".

Desejo do dia: Boa viagem para a minha mami.